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Por uma escola convicta

Opinião Pública | 18/07/2016 | | IFE CAMPINAS

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Quando eu tinha por volta de 15 anos, lembro-me de ter voltado para casa indignado. Sentei me à mesa do almoço e questionei meus pais: por que eles não tinham feito nada contra o regime militar? Eles viram uma ditadura nascer e tiveram medo ou foram cúmplices de uma situação que mergulhou o País na intolerância?

Essa memória de adolescência foi resgatada devido ao debate crescente em torno da questão da escola sem partido: querem amordaçar a nós professores, ou se trata de uma legítima reivindicação de pais que não desejam ver seus filhos sob influências que julgam errôneas?

Por um lado, deve-se ressaltar que a neutralidade é uma falácia. Todos nós temos um ponto de vista, um modo de enxergar e interpretar a realidade de maneira própria. Nós professores não somos diferentes.

Seria até mesmo falta de qualificação profissional em um professor de História, de Geografia ou de Redação, ele não ter um ponto de vista sólido sobre os problemas do nosso tempo, em especial o político. Nesse sentido, uma escola sem partido é impossível, tendo em vista que as pessoas são partidárias.

Mas, por outro lado, a convicção não pode ser desculpa para a doutrinação, seja religiosa ou política. O que quero dizer com isso? Acredito que nós, professores, temos a obrigação profissional de buscar que nossos alunos pensem por conta própria. Como professor de Redação, sei que o aluno argumenta bem quando possui opiniões próprias sobre determinado assunto. O meu ponto de vista é sempre um modo de ajudá-lo a refletir sobre o tema em questão. Não considero bom professor o intolerante. Mobilizar um aluno para passeata, por exemplo, é tão errado quanto convocá-lo para um culto religioso. Por quê? Porque não é esse o nosso trabalho.

O professor, acredito, deve, em primeiro lugar, ensinar com competência a matéria que leciona. Não há competência quando há militância política em sala de aula, quando há pregação religiosa. Porém, muitos de nós professores somos politizados e religiosos. O que fazer? Como garantir que um professor seja tolerante e cumpra a sua função, não apesar de suas convicções, mas justamente com elas?

Uma situação complexa, tendo em vista a escola pública. Já em relação à escola particular, o assunto é mais fácil de ser resolvido. Os pais devem procurar escolas empenhadas em garantir esse difícil, mas possível, equilíbrio, ou que tenham em seus fundamentos convicções as mais próximas possíveis da família.

Acreditar ser esse assunto de pouca importância ou fruto de mentes direitistas é tentar negar às famílias a primazia que têm obrigação de exercer na educação dos filhos. Contudo, os pais devem saber que seus filhos vivem em um mundo repleto de opiniões conflitantes. E, na célebre frase de Riobaldo, em Grande Sertão Veredas, “viver é muito perigoso”. Isto é, não é uma boa ideia tentar que os filhos passem incólumes a pensamentos equivocados. Em primeiro lugar, porque é impossível. Em segundo, porque seria deixá-los confinados a um círculo restrito de pessoas, o que os deixaria, consequentemente, em um círculo estreito de ideias.

Voltando à história inicial, o professor de História da minha adolescência acabou gerando uma oportunidade real em mim de aprender história. Após serem questionados, meus pais contaram-me suas memórias de infância: certo dia eles, crianças, olharam assustados cavalos de um lado para outro e pessoas correndo. O uso da força e a intolerância são marcas de regimes totalitaristas. Havia entendido a lição.

■■ Eduardo Gama é mestre em Literatura pela USP, jornalista, publicitário e membro do IFE-Campinas

Artigo publicado no jornal Correio Popular, edição 16/7/2016, Página A-2.

A inclusão vista de perto

Opinião Pública | 02/06/2015 | | IFE CAMPINAS

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Criança de três anos com autismo indicando um peixe em aquário. Foto: Connie Kasari (Wikipedia Creative Commons: link http://en.wikipedia.org/wiki/Autism#/media/File:Opening_a_window_to_the_autistic_brain.jpg)

Criança de três anos com autismo indicando um peixe em aquário. (Foto: Connie Kasari, Wikipedia – Creative Commons, link da imagem aqui)

 
Muito se discute sobre dos problemas do nosso tempo. De fato, não são poucos. Contudo, há uma questão que me deixa orgulhoso por viver em nossa época. Refiro-me à inclusão, notadamente a escolar. Não porque a vivamos à perfeição – muito pelo contrário –, mas sim pelo esforço que começa a ser feito para termos uma sociedade mais humana e menos propensa a considerar apenas como dignos aqueles sem qualquer transtorno ou deficiência.

Tenho um filho com autismo e sou professor, isto é, vivencio os dois lados dessa solução, incluir, que muitas vezes é um problema.

O lado perverso da inclusão ainda é o fato de haver escolas que negam a matrícula a crianças diferentes. A desculpa, quando existe alguma, é a de que os professores não estão aptos para a tarefa. Mas a primeira questão que deve ser feita a professores, coordenadores e pais é: quem está preparado? Quando recebi o diagnóstico do meu filho, tudo o que tinha era boa vontade. E isso, ao menos no início, faz toda a diferença, tanto do lado da escola como dos pais.

Alguns poderão objetar afirmando ser um dever dos profissionais da educação saber lidar com o transtorno, como por exemplo, o autismo. Mas, mesmo eu, que tenho um filho nessa condição e sou professor, não sei o suficiente para ensinar jovens de 13 a 16 anos, faixa etária em que leciono. Imagine os que pouco ouviram falar sobre o assunto. Além disso, não existe apenas o autismo, mas diversas síndromes e deficiências que exigem um cuidado individualizado, isto é, de um para um. Como um professor pode realizar essa tarefa em meio a mais 30 alunos?

O último livro que li a respeito, TEA e inclusão escolar, de Anita Brito, professora e mãe de um jovem com autismo, é muito elucidativo porque mostra a inclusão como um processo no qual escola e família devem trabalhar juntas. Os problemas acontecem quando uma das partes não compreende esse fato. A escola pensa estar fazendo um favor à família e, por isso, em face de qualquer problema, tende a demonstrar irritação. Os pais, por sua vez, podem ver preconceito em tudo e serem hipersensíveis a qualquer observação da escola.

Enquanto as faculdades não “incluírem a inclusão” como matéria obrigatória e fundamental ante os desafios atuais, ela acontecerá quando a escola e a família aceitarem a criança tal como ela é. Assim, os desafios que forem surgindo serão superados com compreensão e conhecimento. Os pais podem ajudar e muito para que a escola do filho seja de fato inclusiva, principalmente auxiliando-a a lidar de forma mais eficaz com a criança. Bons profissionais aceitarão de bom grado essa ajuda, pois serão profissionais mais capacitados e humanos.

O meu filho é estimado por toda a escola na qual estuda. Gostaria que todos os pais de crianças especiais soubessem como é bom ver que o filho está em boas mãos. Enquanto nenhum poder público cumpre a sua obrigação, escola e pais devem fazer não a inclusão dos sonhos, mas a possível e que pode transformar a vida dos nossos filhos.

Eduardo Gama é mestre em Literatura pela USP, jornalista, publicitário e membro do IFE Campinas

Artigo publicado no jornal Correio Popular, 1º de Junho de 2015, Página A2 – Opinião.

Educação que não educa

Opinião Pública | 28/05/2015 | | IFE CAMPINAS

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O tema da educação é tão recorrente e desgastado que muita gente nem discute mais a questão. Fala-se muito, mas pouca diferença se percebe na prática. A grande praga da educação brasileira, sem generalizações apressadas, são os especialistas em educação.

O “especialismo” é um grande mal no sentido de que o “educador” de gabinete considera sua área de conhecimento como o único problema relevante e merecedor de toda atenção da sociedade. Clemenceau já dizia, referindo-se ao especialismo do exército francês que “a guerra é coisa séria demais para ficar nas mãos dos generais”. A receita pronta e a solução fácil acabam validando pareceres que só podem ser aplicados na própria mente de quem os concebeu. Educadores de gabinete que sequer conhecem a realidade de escolas públicas são os que “legislam” a partir de seus artigos, opiniões e suposições que só podem gerar riso nos professores que estão no front diário de batalha nas salas de aula.

Uma dessas “excelências” em educação, há anos atrás apregoava a luta de classes latente na educação brasileira, bradando com todos os argumentos que os professores eram explorados pelo abstrato “sistema” e que precisavam ser libertos disso. O pretenso educador-profeta elaborou sua teoria, desconhecendo certamente o cotidiano de uma sala de aula e arvorando-se em denunciador da “luta de classes”, só provocou um fardo absurdo que ajudou a remodelar a educação brasileira retirando a autoridade da escola e do professor, destruindo qualquer noção de meritocracia através da “política de não-reprovação”. A tal “libertação” das famigeradas estruturas de “exploração” burguesa não veio, provando que não há maior exploração do que impor a outros o que pessoalmente não se quer assumir. Vale aqui o princípio cristão de somente fazer ao outro o que se deseja para si.

A solução de qualquer tipo de problema só pode chegar a bom termo a partir da diversificação de visões sobre um mesmo assunto. É louvável que um profissional valorize sua formação, mas jamais deve fazê-lo perdendo a visão de conjunto. Quem não é especialista, muitas vezes consegue ter uma visão mais lúcida da realidade, daí a importância em se adquirir e cultivar certa erudição e uma visão mais eclética das coisas, fornecendo sempre mais elementos para um juízo claro sobre a realidade.

O político grego, atento aos problemas da polis conseguia ter uma visão de conjunto que o capacitava a eleger prioridades de modo prático. São Bento de Núrsia grande herdeiro e difusor da cultura greco-romana na época da decadência do Império Romano, estabelece um princípio claro e objetivo para a gestão: na eleição de um abade, se tivessem como candidatos um monge santo, um erudito e um prático, deveriam optar pelo prático, pois ao santo cabe rezar; ao erudito cabe estudar e difundir o que sabe e ao prático, por ter visão objetiva das coisas, cabe governar. Aqui está um princípio básico de gestão criado no século V e que hoje ainda conserva sua validade e efetividade.

Portanto, soluções prontas e demasiadamente plásticas devem suscitar desconfiança por carecerem de embasamento na realidade. Pode ocorrer que tenham um embasamento virtual construído sobre pressupostos teóricos e amplamente louvados como as “pedagogias do amor ou do oprimido” que melífluamente resolvem tudo com base no cuidado individual e na construção do saber a partir da “realidade do educando”, ignorando, no entanto que isso não corresponde à realidade das salas de aula atuais. Simplesmente tais teses não são aplicáveis e só conquistaram o grande mérito de tentar extinguir o que havia de bom e de funcional na educação tradicional e substituí-los por práticas equivocadas e que não deram nem um terço dos frutos esperados. Temos um modelo de educação que simplesmente não educa.

 

Luiz Raphael Tonon é professor de História e Filosofia e gestor do Núcleo de Teologia do IFE Campinas (raphael.tonon@ife.org.br).

Artigo publicado no jornal Correio Popular, 15 de maio de 2015, Página A2 – Opinião.

Protegendo os filhos dos perigos da escola

Educação | 01/08/2014 | | IFE CAMPINAS

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Recentemente, Matthews Hennessey publicou na Crisis Magazine um artigo chamado “Protecting Your Child from the Dangers of College Life” (em tradução livre: “Protegendo seu filho dos perigos da vida no colégio”. Nele, o autor relata uma experiência de pôr um filho na escola por volta de seus dez anos de idade e os riscos que isso traz, como a educação que ele irá receber fora de casa, com ensinamentos que nem sempre são saudáveis e bons aos filhos.

É o caso principalmente relatado no artigo: o da atmosfera altamente sexualizada nos colégios modernos, algo que se aplica não só ao país do escritor (EUA), mas também a vários outros países, como o Brasil. A pergunta que pode ser feita, nesse sentido, e a respeito da temática é: quando chegar a hora de colocar os filhos na escola basta que deixemos eles soltos e completamente livres ou, diferentemente, que os protejamos de algum modo com prudência, moderação, diálogo, justa liberdade, acompanhando a educação recebida fora dentro do próprio lar?

A resposta de Hennessey, baseado na experiência que ele relata, é a segunda: proteger de algum modo os filhos, com os pais também cuidando da educação dos filhos e não os deixando completamente livres, carentes e à mercê de um ambiente nem sempre saudável.

O artigo na íntegra em inglês pode ser lido AQUI.