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Escola sem Partido: uma visão alternativa (por Tarcísio Amorim)

Política e Sociologia | 23/09/2016 | | IFE RIO

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O projeto de lei n. 867 de 2015, popularmente conhecido como Escola sem Partido tem como princípios, dentre outros: a neutralidade política; ideológica e religiosa do Estado; o pluralismo de ideias no ambiente acadêmico e; o direito dos pais a que seus filhos recebam a educação moral que esteja de acordo com suas próprias convicções[1]. O projeto, que já conta com outras versões a nível municipal e estadual, vem suscitando críticas devido a sua ênfase na imparcialidade do ensino e no fato de que relega a educação moral para o plano privado. Por outro lado, seus defensores alegam que a introdução da lei protegeria os estudantes, vulneráveis no processo educativo, das tentativas de doutrinação política exercidas por professores que aderem a esta ou aquela determinada corrente política.

Recentemente, um artigo do historiador Demétrio Magnoli na Folha de São Paulo chamou atenção com seu título “Escola deve ser sem partido, mas também sem Igreja”, que sugeria que o autor concordava em parte com o argumento dos defensores do projeto. Em seu texto, porém, Magnoli denuncia a tentativa de certos setores conservadores da sociedade de se aproveitarem da lei para manter a influência da religião sobre a educação moral, prevenindo a reflexão sobre certos valores liberais, como “o respeito a diferentes orientações sexuais” e “o repúdio a preconceitos raciais”, que o autor tem como princípios básicos e universais, assim como os inscritos da Declaração de Direitos Humanos de 1948. Para ele, tais valores não dependem de uma posição partidária e por isso devem ser ensinados na escola, mesmo contra a vontade dos pais[2]. A verdade é que em sua tentativa de salvar a escola republicana do conservadorismo do projeto, Demétrio Magnoli comete o mesmo erro dos seus promotores, o de tomar os princípios liberais como neutros, impedindo tanto o pensamento crítico, como a capacidade de perceber que toda concepção de justiça e direito está ligada a uma visão de mundo, cujas crenças – ainda que em constante mudança – determinam as normas de comportamento.

Grande parte da crítica ao projeto Escola sem Partido se dirige ao mito da imparcialidade, alegando-se que a busca por tal ideal mascara a tentativa de manutenção de certas relações de poder, que seriam expostas em um ensino crítico. Embora diversos problemas de natureza política emerjam quando professores de ensino primário e secundário avançam suas convicções partidárias em classe, a separação do ensino moral do restante do currículo escolar parece sim corroborar uma visão liberal de ensino, que não reconhece que os valores democráticos derivam das próprias concepções éticas de uma comunidade política. Com efeito, o filosofo estadunidense John Rawls acreditava na possibilidade de um estado no qual normas básicas de justiça e matérias constitucionais seriam o resultado de um acordo racional entre indivíduos com diferentes visões de mundo e origens socioculturais pois, segundo ele, qualquer cidadão razoável poderia comprometer-se com a moralidade liberal – com todos os atributos advindos dos princípios de igualdade e liberdade – deixando outras questões morais, ligadas a ideologias seculares ou religiosas, para o âmbito privado. Rawls equivocava-se por imaginar que certas concepções de justiça surgiriam como fruto de uma racionalidade pura, desembaraçada das influências do ambiente, classe, religião ou partido, que como argumenta Michael Sandel, seu compatriota de Harvard, determinam as concepções de bem, e portanto as visões de justiça[3].

De fato, boa parte das críticas ao projeto liberal Rawlsiano vem de autores comunitaristas e multiculturalistas que apontam para o risco de generalização dos valores liberais para culturas que prezam pela unidade entre suas visões culturais e religiosas e a vida política. No Reino Unido, tal conflito torna-se explicito quando minorias religiosas demandam o reconhecimento de práticas consideradas antiliberais, como a circuncisão feminina ou os casamentos arranjados. Sobre o último ponto, Nancy S. Netting conduziu há uns poucos anos uma pesquisa na qual entrevistou jovens de origem indo-canadense sobre suas visões a respeito dessa tradição. Embora encontrasse alguns opositores, ela demonstrou que para muitos deles a visão de que o amor e uma escolha individual não era comum entre os jovens. Com efeito, Netting percebeu que a ideia de que a vida da pessoa deveria ser orientada para a coletividade, de modo especial a família, desafiava certas concepções liberais de liberdade. Até mesmo a noção de amor como um sentimento posterior a escolha, e não um determinante a priori, põe em causa a naturalidade como essas questões são abordadas no ocidente[4]. Mesmo que atualmente exista uma tendência por reconciliar certas demandas culturais com os princípios liberais, através do oferecimento de um arranjo de opções matrimoniais para os jovens, fica claro que o conceito de liberdade Rawlsiano está longe de um consenso no mundo real. Assim, a declaração de Direitos, a qual Magnoli se refere, também pode ser vista como partidária e etnocêntrica.

Mas seria isso um problema? Como então reconciliar o pluralismo de ideias, necessário em uma democracia, com o papel cívico da escola? Como pontuei anteriormente, a insistência numa suposta neutralidade somente iria mascarar o comprometimento do Estado com certos valores éticos, que emergiriam em algum ponto do debate trazendo novamente à tona os conflitos ideológicos. O esforço dos agentes públicos e atores políticos deveriam concentrar-se na regulação do processo educativo, de modo a promover maiores possibilidades de crítica, com uma abordagem formativa e visão de equidade. Nessa linha, os sistemas de ensino da Inglaterra e da Irlanda proveem um bom exemplo de como essa abordagem pode funcionar. Em contraste com o modelo de neutralidade liberal, eles assumem que os valores morais que dão origem as concepções de justiça nesses países tem sua origem na história e tradições sociais. O papel do ensino religioso ilustra essa perspectiva: oferecido como uma matéria obrigatória, ele integra questões morais e cívicas de modo a suscitar o pensamento crítico no aluno. Na Inglaterra, uma das metas do ensino público é o “Desenvolvimento Moral e Espiritual”, que busca fomentar a reflexão acerca “das origens do universo, o propósito da vida, a natureza das provas, a singularidade da vida humana e o sentido da verdade”[5]. Na Irlanda, o processo educativo visa ir além dos fatos empíricos para abarcar “as dimensões estéticas, espirituais, morais e religiosas da experiência da criança e seu desenvolvimento”[6]. Nos últimos anos, o ensino religioso dos dois países sofreu diversas transformações para integrar o estudo de religiões não cristas e minoritárias. No entanto, o cristianismo segue considerado como a principal fonte dos valores cívicos, fato que é reconhecido pela Ato de Reforma Educacional Britânico, que exige até mesmo participação dos alunos em um ato cristão de oração conjunta – permitindo a dispensa a pedido dos pais – e pelo Conselho Nacional para Avaliação e Currículo da Irlanda, que declara que no pais “o cristianismo é parte de nossa herança cultural e desempenhou um significativo papel em moldar nossa visão de identidade, nosso mundo e nossos relacionamentos com outros”[7]. Em suma, ambos endossam uma concepção abrangente da relação entre cultura e vida pública, ao mesmo tempo em que enfatizam o papel do professor em promover a reflexão do aluno sobre um vasto ramo de questões morais que emergem do convívio social e do contexto histórico.

Não é difícil perceber como tal modelo de ensino afasta-se das propostas liberais que traçam uma linha divisória entre valores públicos e concepções particulares de bem, excluindo do espaço público qualquer discussão sobre ideologias privadas, preferências comunitárias ou doutrinas religiosas. Mais importante, tal divergência filosófica deve-se ao próprio entendimento que promotores de uma visão liberal ou comunitária de Estado têm sobre o mundo, a natureza da razão, e da justiça – em poucas palavras, sobre a verdade. Embora os teóricos liberais tenham mais dificuldade em aceitar tal fato, é notável que a própria visão de que as normas de justiça derivam de uma racionalidade não-metafisica, ou seja, de razoes seculares desvinculadas de uma compreensão abrangente dos fins da vida humana – como John Rawls, Ronald Dworkin e outros filósofos políticos propõem – está comprometida pela sua própria parcialidade. Como Jürgen Habermas apontou, para aqueles que pertencem a uma tradição de fé, “sua concepção de justiça religiosamente fundada lhe diz o que e politicamente correto ou incorreto”, o que significa que “o estado liberal, que expressivamente protege tais estilos de vida em termo de direitos básicos, não pode ao mesmo tempo esperar de todos os cidadãos que eles também justifiquem suas posições politicas independentemente de suas convicções religiosas”[8]. Vale dizer que nem mesmo Rawls questiona a razoabilidade das doutrinas religiosas ou mesmo ideologias políticas, que possuem uma racionalidade ética própria, mas acredita que sua moralidade abrangente aplica-se apenas ao âmbito privado, devido as discordâncias que suscita. Entretanto, como apontam os teóricos republicanos e comunitaristas, toda concepção de justiça, ainda que restrita a normas básicas de direito, é controvertida, e a própria ideia de uma esfera pública diferenciada dos valores éticos comunitários é inaceitável em diferentes culturas e sistemas de pensamento. Em resumo, tais visões de mundo são auto-excludentes.

Mas como tal conclusão pode nos ajudar a compreender as contradições do projeto escola sem partido? Voltemos ao exemplo do ensino religioso. É verdade que o professor, de acordo a proposta de lei, deveria promover a discussão de diferentes teorias e vertentes de pensamento. O problema é que o próprio sistema de ensino, na sua base, já se fundamenta em determinadas concepções políticas e teóricas. Supondo, por exemplo, que exista uma discussão em classe sobre a relação entre esfera pública e religião, e consequentemente sobre a própria necessidade do ensino religioso. Seria difícil falar em imparcialidade uma vez que países como Estados Unidos e França adotam uma visão mais estrita de neutralidade liberal, com um ensino público laico, enquanto que na Inglaterra, Irlanda e outros países europeus a ideia de que as tradições religiosas são um importante componente da vida pública determina as políticas educacionais, fazendo com que as escolas do Estado promovam uma concepção comunitarista de justiça desde o princípio. Ainda que os alunos possam – e devam – continuamente refletir sobre tais arranjos e critica-los, é razoável dizer que a criança que foi educada em uma escola que valoriza o ensino religioso terá uma visão especifica do seu significado, tendo acesso a recursos e experiências diferenciadas. Enquanto isso, os que receberam um ensino secular, ainda que se informem por outros meios, tenderão a apreender o estilo de vida que a concepção liberal de justiça suporta através de sua própria vivência. Isso porque a relação entre experiência e aprendizado é tal que não se pode desprezar a influência do meio e das práticas sociais na interpretação pessoal do mundo em que se vive. De maneira nenhuma isso significa dizer que os alunos irão sempre apoiar a política educacional vigente em seu pais, mas ainda que não o façam, sua visão será marcada pelos recursos e experiências a que tiveram acesso em seu ambiente cultural. É significativo que mesmo com o declínio das práticas religiosas na Inglaterra, a maioria de sua população ainda defende a permanência do ensino religioso no currículo nacional[9].  De certo, qualquer discussão sobre essa temática deverá ocorrer dentro de um arranjo político pré-estabelecido, que reflete desde o início a concepção de justiça da maioria – por ex.: liberal na Franca e nos Estados Unidos, e comunitarista na Inglaterra ou na Irlanda.

Visto, portanto, que a ideia de neutralidade do ensino mostra-se improcedente, pode-se perguntar qual o papel do educador na formação do aluno, dado o risco de monopolização das opiniões pelo professor ou outras autoridades competentes de ensino. Sobre esse ponto, deve-se aceitar a proposta dos autores do projeto de que diferentes versões teóricas – bem como concepções de justiça e bem – sejam apresentadas aos estudantes, pois o objetivo do ensino critico-reflexivo não é a exclusão da formação moral do estudante, mas um constante exercício de reavaliação das normas de justiça vigentes. Nesse processo, deve-se ter mente que: 1) é impossível a visão de um objeto por todos os seus ângulos, e portanto as versões apresentadas emergem também de uma situação particular no qual certas questões vem à tona na história e no contexto do desenvolvimento de cada comunidade – nunca a partir de um ponto de vista neutro; 2) nas escolas públicas, os conteúdos didáticos devem seguir decisão deliberativa democrática, distinguindo-se os programas de alçada federal, estadual e municipal, de modo a refletir as concepções da maioria e condicionar – embora sem extinguir – a discricionariedade das autoridades escolares; 3) a reflexão sobre a diversidade de opiniões não deve impedir, mas promover a deliberação sobre princípios de moralidade e justiça, que deverão sempre estar sujeitos a reavaliação ao longo do tempo [10]. Com efeito, em meio a seu receio de render o ensino público às forças conservadoras da religião, Demétrio Magnoli erra por impor ele mesmo uma visão dogmática do ensino, tomando certos princípios liberais como verdades universais, acima de qualquer disputa. Em sociedades cada vez mais multiculturais, tal abordagem liberal perde cada vez mais seu apelo e mostra-se incapaz de lidar com a divergência entre diferentes concepções de justiça. Nesse contexto, somente um ensino no qual a formação moral está entrelaçada com a avaliação das visões substanciais de bem pode dar uma resposta coerente às demandas sociais do mundo moderno e fazer valer o papel da escola como promotora do pensamento crítico.

 

Tarcísio Amorim é doutorando em Ciência Política pela University College Dublin e Mestre em História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.

 

NOTAS:

[1] BRASIL. CÂMARA DOS DEPUTADOS. Projeto de lei n. 867, de 2015. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/1317168.pdf>. Acesso em 23/08/2016

[2] MAGNOLI, Demétrio. Escola deve ser sem partido, mas também sem Igreja. Folha de São Paulo, 13 de agosto de 2016. Disponível em: < http://www1.folha.uol.com.br/colunas/demetriomagnoli/2016/08/1802413-escola-deve-ser-sem-partido-mas-tambem-sem-igreja.shtml>. Acesso em 23/08/2016.

[3] SANDEL, Michael. Liberalism and the Limits of Justice. New York: Cambridge University Press, 1982.

[4] NETTING, Nancy S. Two-Lives, One Partner: Indo-Canadian Youth between Love and Arranged Marriages. Journal of Comparative Family Studies, v. 37, n. 1 (Inverno), 2006, pp. 129-146.

[5] REINO UNIDO. National Curriculum Council. Spiritual and Moral Development: a Discussion Paper, 1993, p. 6. Disponível em: <www.educationengland.org.uk/documents/ncc1993/smdev.html>. Acesso em 23/08/2016.

[6] REPUBLICA DA IRLANDA. Department of Education. Primary School Curriculum: Introduction. Dublin: Government Publications, 1999, p. 27.

[7] REPUBLICA DA IRLANDA. Department for Education and Skills. National Curriculum Council Association. Religious Education Sylllabus: Leaving Certificate, p. 3. Disponível em: <https://www.curriculumonline.ie/getmedia/634e6941-03f5-4599-ad97-61316e336360/SCSEC29_Religious_Ed_syllabus_eng_1.pdf>. Acesso em: 31/05/2016.

[8] HABERMAS, Jürgen. Religion in the public sphere. European Journal of Philosophy, 14, 1, 2006, p. 8.

[9] RE YouGov Survey: Public Support for RE in Schools, 2015. Disponível em <http://www.ahrc.ac.uk/newsevents/news/faith-and-education-debate/>. Acesso em: 25/08/2016.

[10] Vale ressaltar que a descentralização – e não privatização – da educação moral é mais eficaz, pois permite aos alunos confrontarem diferentes visões de mundo diretamente a partir de suas bases comunitárias, onde os conteúdos das proposições podem ser demonstrados a partir da própria experiência individual a coletiva.

 

Publicado no site da revista-livro do IFE (Instituto de Formação e Educação), Dicta&Contradicta, em Setembro de 2016 (link).

 

 

Por uma escola convicta

Opinião Pública | 18/07/2016 | | IFE CAMPINAS

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Quando eu tinha por volta de 15 anos, lembro-me de ter voltado para casa indignado. Sentei me à mesa do almoço e questionei meus pais: por que eles não tinham feito nada contra o regime militar? Eles viram uma ditadura nascer e tiveram medo ou foram cúmplices de uma situação que mergulhou o País na intolerância?

Essa memória de adolescência foi resgatada devido ao debate crescente em torno da questão da escola sem partido: querem amordaçar a nós professores, ou se trata de uma legítima reivindicação de pais que não desejam ver seus filhos sob influências que julgam errôneas?

Por um lado, deve-se ressaltar que a neutralidade é uma falácia. Todos nós temos um ponto de vista, um modo de enxergar e interpretar a realidade de maneira própria. Nós professores não somos diferentes.

Seria até mesmo falta de qualificação profissional em um professor de História, de Geografia ou de Redação, ele não ter um ponto de vista sólido sobre os problemas do nosso tempo, em especial o político. Nesse sentido, uma escola sem partido é impossível, tendo em vista que as pessoas são partidárias.

Mas, por outro lado, a convicção não pode ser desculpa para a doutrinação, seja religiosa ou política. O que quero dizer com isso? Acredito que nós, professores, temos a obrigação profissional de buscar que nossos alunos pensem por conta própria. Como professor de Redação, sei que o aluno argumenta bem quando possui opiniões próprias sobre determinado assunto. O meu ponto de vista é sempre um modo de ajudá-lo a refletir sobre o tema em questão. Não considero bom professor o intolerante. Mobilizar um aluno para passeata, por exemplo, é tão errado quanto convocá-lo para um culto religioso. Por quê? Porque não é esse o nosso trabalho.

O professor, acredito, deve, em primeiro lugar, ensinar com competência a matéria que leciona. Não há competência quando há militância política em sala de aula, quando há pregação religiosa. Porém, muitos de nós professores somos politizados e religiosos. O que fazer? Como garantir que um professor seja tolerante e cumpra a sua função, não apesar de suas convicções, mas justamente com elas?

Uma situação complexa, tendo em vista a escola pública. Já em relação à escola particular, o assunto é mais fácil de ser resolvido. Os pais devem procurar escolas empenhadas em garantir esse difícil, mas possível, equilíbrio, ou que tenham em seus fundamentos convicções as mais próximas possíveis da família.

Acreditar ser esse assunto de pouca importância ou fruto de mentes direitistas é tentar negar às famílias a primazia que têm obrigação de exercer na educação dos filhos. Contudo, os pais devem saber que seus filhos vivem em um mundo repleto de opiniões conflitantes. E, na célebre frase de Riobaldo, em Grande Sertão Veredas, “viver é muito perigoso”. Isto é, não é uma boa ideia tentar que os filhos passem incólumes a pensamentos equivocados. Em primeiro lugar, porque é impossível. Em segundo, porque seria deixá-los confinados a um círculo restrito de pessoas, o que os deixaria, consequentemente, em um círculo estreito de ideias.

Voltando à história inicial, o professor de História da minha adolescência acabou gerando uma oportunidade real em mim de aprender história. Após serem questionados, meus pais contaram-me suas memórias de infância: certo dia eles, crianças, olharam assustados cavalos de um lado para outro e pessoas correndo. O uso da força e a intolerância são marcas de regimes totalitaristas. Havia entendido a lição.

■■ Eduardo Gama é mestre em Literatura pela USP, jornalista, publicitário e membro do IFE-Campinas

Artigo publicado no jornal Correio Popular, edição 16/7/2016, Página A-2.

Família educadora

Opinião Pública | 13/07/2016 | | IFE CAMPINAS

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Se é verdade que toda criança tem direito à educação, não menos importante é ressaltar que a educação dos filhos é, antes de tudo, um direito dos pais, cujo reconhecimento nasce da justa percepção de que a família é o lugar, por excelência, da proteção das crianças e adolescentes. Trata-se de um direito natural, que nasce da própria filiação e garante aos pais a prerrogativa de educar os filhos com liberdade, segundo seus valores morais e éticos, sem a intromissão de qualquer outra instância, exceto diante de violações graves à dignidade dos filhos, cabendo às demais instituições um papel sempre subsidiário.

A família, assim como as chamadas instituições intermediárias (associações, clubes, escolas, igrejas), são uma proteção orgânica à pessoa humana, sem a qual o indivíduo se fragiliza, ficando à mercê de injustiças e arbitrariedades de todo tipo, inclusive as cometidas pelo poder estatal. Por isso, um dos efeitos mais devastadores da engenharia social em curso em nossa sociedade é o enfraquecimento da família que, entre outros aspectos, atinge diretamente esta garantia essencial da ordem social.

Neste contexto, é cada vez mais crescente a criação de mecanismos legais e práticas sociais que vão se impondo, pouco a pouco, à partir de um discurso que se apoia na defesa dos “direitos das crianças”, somente como recurso retórico para justificar a ingerência, cada vez maior, do Estado (e sua burocracia) na relação entre pais e filhos, como ocorreu, por exemplo, com a publicação da “lei da palmada” (Lei 13.010/2014) ou com as tentativas de proibição do ensino doméstico (homescholling). O Estado surge, assim, em lugar da família, como o verdadeiro “amigo da criança”, como o seu legítimo protetor, inclusive contra os próprios pais, e como a instância primeira onde serão definidos os “valores da cidadania” que serão a base da educação, em uma inversão perversa daquela estrutura natural referida acima.

Por outro lado, esta tendência ganha lastro numa concepção igualitária da estrutura familiar, que banaliza as diferenças entre pais e filhos e a divisão, naturalmente hierárquica, de papéis, relativizando as prerrogativas dos pais sobre os filhos. Por influência de uma mentalidade equivocada sobre o significado do amor filial e de uma desproporcional reação aos modelos de educação das gerações anteriores, criam-se distorções na vivência da afetividade e do diálogo na família, levando os próprios pais a simplesmente abdicarem do exercício fundamental do poder familiar.

Este cenário é, ainda, favorecido pela adoção de um modelo social que não privilegia a vida familiar, gerando enormes dificuldades aos pais em conciliar os deveres da paternidade e maternidade com as demais obrigações, principalmente, profissionais. Por vezes, assiste-se a uma verdadeira “terceirização” da educação dos filhos, que são entregues, ainda em tenra idade, a instituições que passam a assumir o protagonismo da educação das crianças. Atitude que acaba por ser confirmada e justificada pelo predomínio de valores éticos que tendem a dar prioridade à satisfação dos desejos e projetos individuais, em detrimento dos sacrifícios inerentes à função de educar.

Assim, não há dúvidas de que um dos maiores desafios que despontam no horizonte dos nossos dias é o fortalecimento das famílias, o que necessariamente depende da reafirmação da papel dos pais no exercício do poder familiar. O maior bem que um pai e uma mãe podem oferecer a seus filhos e, portanto, a forma mais digna de amor que podem dedicá-los, é a assunção integral de seus papéis como seus educadores. Nenhuma instituição poderá substituí-los nesta função sem prejuízos enormes às crianças e adolescentes. Por sua vez, ao Estado deve ser reconhecida, tão somente, a legitimidade de garantir o exercício deste direito, protegendo as famílias de quaisquer ingerências indevidas em sua unidade e promovendo a sua estrutura natural.

João Marcelo Sarkis, formado pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (USP), analista jurídico do Ministério Público de São Paulo, gestor do núcleo de Direito do IFE Campinas.

e-mail: joaosarkis@gmail.com

Artigo publicado no jornal Correio Popular, edição 13/7/2016, Página A-2.

Fotos 4º Seminário IFE/ACL: "Ética e Educação" (05/Dez/2015)

Fotos | 01/06/2016 | | IFE CAMPINAS

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4º Seminário IFE/ACL | Tema: “Ética e Educação” (05/Dez/2015)
Fotos: Carlos Sousa Ramos/AAN
Informações do evento neste post.

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