Nasce um pai

Opinião Pública | 06/07/2016 | | IFE CAMPINAS

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A paternidade pode parecer algo corriqueiro, afinal, há milhares de anos a humanidade perpetua sua espécie e nada de diferente parece existir sob o mesmo céu. Também pensei assim por muito tempo, até descobrir que seria pai.

Sempre pensei em sê-lo, mas nunca me preparei para isso e nem tinha muita preocupação em saber como isso se daria. Para mim bastava planejar “quando”, preparar tudo para a chegada do bebê e pronto. Mentalmente estava tudo organizado pragmaticamente. No entanto, todas as certezas e planos que eu tinha mudaram absurdamente, pois enquanto eu imaginava que tudo dependia de organização, de repente, a notícia de que estávamos, minha esposa e eu, esperando pela chegada de nosso primeiro bebê, tudo mudou. A notícia me paralisou e esse estado só melhorou um pouco quando vi nosso bebê pela ultrassonografia. Dali em diante, ao menos para o pai que não carrega e não tem como saber exatamente o que se passa com a mãe, vem a consciência clara de que recebeu e deve cuidar de um imenso tesouro: uma nova vida humana!

Sem me dar conta de momento, só pensava em quando o bebê, que agora sabíamos ser uma menina, nasceria. Como seria seu rostinho, se iria chorar ou dormir muito, se teria os olhos da mesma cor que os meus e de minha esposa, se seria falante, enfim, passava diante de mim um oceano de possibilidades, mas com tudo isso, percebi que algo novo começava ali: nascia um pai! Antes de ter minha filhinha nos braços eu já me tornara um pai, e minha esposa uma mãe. As preocupações mudaram, as finanças se reorientaram, a programação dos finais de semana e dias livres passaram a ser gerenciadas entre visitas a lojas de móveis e de roupas de bebê. As conversas de casal continuaram a existir, mas agora sempre entrecortadas por algum comentário, alguma preocupação, intuição ou suposição de como será nossa bebê. As orações dirigidas a Deus também mudaram, aos poucos passamos a pedir e agradecer muito mais pela nova vida que Ele nos confiou. Devagar já não vivemos mais tanto para nós mesmos, mas para uma outra criaturinha que Deus mesmo, enquanto Criador por excelência, nos chamou para sermos cocriadores com Ele.

Toda preparação para a chegada de uma nova vida, imagino, traga uma graça e uma beleza particulares, pois cada vida é única e irrepetível. Mesmo antes de nascer, minha pequena Olívia, assim como eu, já é professora. Eu o sou profissionalmente, ganho meu pão assim, mas ela o é por natureza, já que mesmo antes de nascer já tem me ensinado tanto, e fez de mim algo que diploma algum pode fazer: um pai! Nasce uma bebê e com ela um pai e uma mãe.

A beleza de uma nova vida, o seu desenvolvimento, os chutes e reviravoltas que deixam a mãe cansada, a barriga que cresce e obriga a mãe a desacelerar de tudo, os preparativos, tudo isso é belo, é humano e divino ao mesmo tempo, e me fez pensar mais seriamente do que antes no horror que é o aborto, a morte de inocentes no ventre de suas mães. O corpo de uma mulher, mormente o de uma mãe é um santuário de vida e há quem insista em transformar os ventres em túmulos. Esse pequeno ser que ali se desenvolve é sempre um presente para toda a humanidade. Todo filho nos obriga a ser melhores, pois olhando para eles, pensamos no que precisam, nos esquecemos de nós e nos damos a eles. Uma nova vida nos desinstala de nosso comodismo, nos torna menos egoístas. Sendo pai me tornei mais esposo, aprendi a amar mais, tomei consciência do que devo ser e entendi de modo mais claro por que chamo Deus de meu Pai. De fato faz todo sentido pensar, como dizia Pio XII, que “nos lares em que sempre há um berço de onde se ouve o choro de um bebê, as virtudes florescem espontaneamente, enquanto o vício se afasta como que expulso pela infância, que aí se renova qual brisa fresca e vivificante da primavera.”

■■ Luiz Raphael Tonon é professor de História e Filosofia nas redes pública e particular, gestor do Núcleo de Teologia do IFE Campinas e leigo consagrado da comunidade Católica Pantokrator (raphaeltonon@ife.org.br).

Artigo publicado originalmente no jornal Correio Popular, Página A-2 – Opinião, edição de 06 de Julho de 2016.