O triunfo no fracasso


Há mais de dois mil anos, um casal buscava lugar para se abrigar, a mulher estava para dar à luz. Estavam na cidade de Belém, por conta do censo ordenado pelo imperador romano e todas as casas e hospedarias estavam lotadas, não havendo lugar para eles, restava como alternativa se abrigar num estábulo, junto dos animais.

Esse acontecimento, marcado pelo fracasso de um casal revela o evento que mudaria a História: Deus se fez Homem e sendo eterno decidiu prender-se ao tempo, sendo infinito, decidiu encerrar-se no seio de uma Virgem, ser gerado e nascer como todos os homens. O fracasso humano de Maria e de José foi o pretexto usado por Deus para entrar na História. Na miséria do presépio Deus se aniquila e exulta de alegria porque Ele é amor e vem até o homem, sua criatura que perdeu-se pelo pecado, pelo mau uso de sua liberdade; por isso o Verbo de Deus se torna homem “para ensinar o homem a ser homem” (João Paulo II), já que o pecado o havia desviado de seu fim primordial. Com o nascimento de Cristo, no dizer de C.S. Lewis, “pela primeira vez, a humanidade viu um homem de verdade”.

Deus se encarna por amor e o amor implica doação, entrega total à pessoa amada e esse é o desejo de Deus pela humanidade, de modo que só é possível compreender o mistério do nascimento do Homem-Deus Jesus Cristo em sua íntima conexão com o Calvário, com sua morte na Cruz, onde seu amor vai até as últimas consequências. No presépio Deus se aniquila ao descer de sua glória à nossa miséria humana, fazendo-se a nós semelhante (Fl. 2,7) e na Cruz Ele novamente se aniquila perdendo o aspecto humano, conforme recorda a profecia de Isaías ao afirmar que “não tinha beleza nem atrativo para o olharmos, não tinha aparência que nos agradasse. Era desprezado como o último dos mortais, homem coberto de dores, cheio de sofrimentos; passando por ele, tapávamos o rosto; tão desprezível era, não fazíamos caso dele”(Is. 53,1-2). Mistério do amor divino que inscreve neste jeito de agir a sua Lei, ou seja, por sua própria natureza de Criador, Deus ama os homens incondicionalmente como suas criaturas.

Ao nascer, Cristo triunfa sobre o mal no mundo e sobre o mal que há em cada ser humano que Nele crê. Na história humana, quando Deus triunfa, não o faz de modo aparente e esplendoroso. A lógica do triunfo de Deus é o escondimento, a alegria e salvação se recobrem com a aparência do fracasso: o fracasso do presépio, onde todos o rejeitaram, o fracasso da pregação, onde muitos não o ouviram, o fracasso da cruz, onde o conduziram à morte, o fracasso das perseguições à Igreja, seu corpo ao longo da História… No entanto, é nestes aparentes fracassos que a glória de Deus se manifesta. Não há modo mais humano de Deus entrar na história do que através do fracasso. A vida de qualquer pessoa é constantemente marcada por eles, seja um projeto que dá errado, alguma situação que leva à desagregação da família, a fome, o desemprego, o endividamento, a miséria… Nada mais humano que o fracasso e por isso, ao entrar no mundo como homem, Cristo assume o fracasso como caminho para a glória.

Na noite de Natal os anjos anunciaram aos pastores: “Glória a Deus nas alturas e paz na Terra aos homens de boa vontade” (Lc. 2,14). Nasceu o príncipe da paz, aquele que ensinará a Lei de Deus, segundo a qual do mesmo modo que Deus triunfa a partir do fracasso na História da humanidade, assim também em nossa vida pessoal, pois quando fracassamos temos a oportunidade de reconhecer que somos pobres, pequenos, pecadores, mas que Deus é por nós, se fez homem e veio em nosso socorro e por isso, se caímos, cabe a nós o esforço de nos levantamos, insistir e seguir nosso caminho Se queremos que Deus faça parte de nossa História temos de aprender de Cristo a transformar nossa dor em amor, nosso fracasso em decisão de fazer o bem a nós mesmos e aos outros.

L. Raphael Tonon é professor de História, Filosofia, Ensino Religioso e gestor do Núcleo de Teologia do IFE Campinas (raphaeltonon@ife.org.br).

Artigo publicado no jornal Correio Popular, edição 27/12/2017, Página A-2, Opinião.




Um não sei que especial


O dia 26 de julho, desde muitos séculos foi estabelecido na liturgia da Igreja como a celebração da memória de São Joaquim e Santa Ana, pais de Maria e, portanto avós de Jesus Cristo. Desta memória litúrgica nasceu a comemoração do Dia dos Avós.

Convivi alguns anos com meus avós maternos, os paternos já haviam falecido antes mesmo que meu pai tivesse se casado e ao longo de minha vida fui me deparando com muita gente mais vivida que ocupou um pouco esse posto de avô ou avó. Meus avós maternos eram gente muito simples, nasceram e viveram sua vida toda na pequena cidade mineira de Andradas, de onde saíram poucas vezes. Eram figuras veneradas por mim e tinham um “não sei que” de especial que desde menino me fazia querê-los muito bem e desejar estar com eles, em especial para ouvir as histórias que contavam do tempo em que viveram na roça, quando minha mãe ou meus tios nasceram, o que faziam, que dificuldades passaram… Não falavam muito, mas ainda assim me sentia amado por eles e ouvir isso verbalmente pouco me importava.

Muita gente distingue o amor “afetivo” do amor “efetivo” e há muito de verdade nesse tipo de distinção. Lembro-me de meu avô que foi agricultor a vida toda, taciturno, observava tudo, não tinha o costume de fazer carinho ou coisa do tipo, mas sabia que eu gostava muito de café e quando ia beber o seu já tirava do armário uma xícara a mais e me avisava que ia tomar seu café. Isso já era o suficiente para que eu entendesse que ele me queria bem.

Minha avó preocupava-se em me fazer comer o tempo todo e em me arranjar do melhor modo para poder dormir ou brincar na sua casa. Minha mãe, como quase toda mãe, julgava que eu abusava dessa bondade querendo sempre que possível ir passar uns dias na casa deles e, não raro, me advertia que não deveria aceitar nenhum convite para passar muito tempo por lá, porém, a cada uma das férias escolares que se avizinhavam, mesmo com as negativas de minha mãe, no fundo eu sempre esperava por aquela visita na casa de meus avós, no qual minha avó acabava perguntando em público, diante de toda família, quando eu iria passar uns dias por lá. Nunca combinei nada com ela e nem teria coragem de fazê-lo, mas como que numa cumplicidade inconsciente a pergunta sempre vinha precisa e certeira, quase constrangendo meus pais a permitirem que eu ficasse um tempo por ali. Mesmo sabendo que meus pais não gostariam que aceitasse, eu nunca recusava.

Minha relação com meus avós sempre foi desse amor efetivo, sem muitas palavras, sem muitos afetos exteriorizados, mas algo simples, direto e claro. Eles sabiam que eu os amava, mesmo sem eu nunca ter lhes dito e o mesmo ocorria comigo. Meu avô morreu numa dessas minhas visitas de férias. Era janeiro, as aulas ainda demorariam a começar. Em maio do ano seguinte foi a vez de minha avó. Com a morte de ambos as férias já não eram mais iguais, mas a memória de ambos me fazia pensar no quanto foi bom tê-los por um tempo, porque de todas as histórias que eu ouvia de minha mãe, incluindo as correções severas de que ela e meus tios foram alvo, essas eram coisas que nunca tinham acontecido comigo e que talvez o afeto que meus avós não souberam ou não puderam lhes dar, foi de certo modo direcionado a mim e aos outros netos, como que numa reserva de amor que era para os filhos, mas que as dificuldades da vida os levaram a oferecer a nós, felizes receptores daquilo que faltou a nossos pais.

Enquanto finalizo estas linhas, vejo se repetir na vida de minha filhinha, ainda bebê, um pouco de minha história: o avô paterno dela também se foi antes que eu casasse, mas ainda que o uso da razão de modo pleno lhe escape, hoje foi dia de levá-la pela primeira vez ao túmulo de seu avô para lhe dizer que ali estava alguém que me ensinou a como ser pai. Celebremos alegremente a vida dos avós que se foram, daqueles que estão conosco e as marcas indeléveis que o convívio com eles imprime em nossas vidas!

L. Raphael Tonon é professor de História, Filosofia e Ensino Religioso, gestor do Núcleo de Teologia do IFE Campinas (raphaeltonon@ife.org.br).

Artigo publicado no jornal Correio Popular, edição 26/07/2017, Página A-2, Opinião.




A treze de Maio


O dia 13 de maio se aproxima e em breve também o fim de semana do Dia das Mães, providencialmente unidos neste ano. No dia 13 recordamos o centenário das aparições da Virgem Maria às três crianças portuguesas, Jacinta, Lúcia e Francisco trazendo do céu um insistente pedido de paz, penitência e conversão. Ainda neste ano celebramos também no Brasil o tricentenário do encontro da imagem de Nossa Senhora Aparecida, a mesma Maria de Nazaré, mãe de Jesus e invocada sob tantos nomes.

A Providência Divina uniu os destinos do Brasil e de Portugal muito antes de nossa colonização, quando na Batalha de Ourique, Dom Afonso Henriques, fundador do reino de português que combatia os invasores muçulmanos da Península Ibérica teve uma visão de Cristo, relatada na crônica denominada “Anais da Santa Cruz de Coimbra”, na qual ouviu a voz do Senhor que lhe prometeu a vitória naquela e em outras batalhas. Ao povo português reservava grandes desígnios e tarefas e por intermédio do rei e dos seus descendentes afirmou que Deus fundaria um império através do qual o Seu Nome seria levado às nações mais estranhas. Entre as nações e povos estranhos confiados a Portugal estamos nós brasileiros que deles recebemos a fé cristã. Com a chegada de Cabral no dia 22 de abril de 1500, houve um esforço apostólico de Portugal de transmitir a fé aos povos aqui encontrados e já no dia 26 rezou-se a primeira missa, tendo no primitivo altar a imagem de Nossa Senhora da Esperança que viajou junto com os portugueses até nossas terras.

Em 1640, Dom João IV consagrou Portugal e seus domínios aos cuidados de Nossa Senhora da Conceição e em 1717, durante a passagem do novo governador de São Paulo e Minas Gerais, o Conde Assumar, pela vila de Guaratinguetá, três pescadores, gente simples e sem instrução miraculosamente apanharam a imagenzinha enegrecida de Nossa Senhora da Conceição, padroeira de Portugal e suas colônias a que deram o título de “Aparecida”.

Em maio de 1917, quando se completavam duzentos anos do evento de Aparecida, Nossa Senhora novamente elege três pessoas simples e de pouca instrução, desta vez crianças portuguesas da cidade de Fátima e pede-lhes que anunciem ao mundo a necessidade de oração, penitência e conversão como meios eficazes para obter de Deus o fim da guerra em curso (1ª Guerra Mundial) e para que se evitasse uma nova guerra e que a Rússia espalhasse seus “erros” (numa referência clara ao comunismo) pelo mundo. Quando a Igreja aprovou o culto a Nossa Senhora de Fátima esculpiram-lhe uma imagem retratando-a tal como as crianças a viram e para tal empreitada utilizaram cedro brasileiro. Quando, no Brasil lançou-se a pedra fundamental da nova Basílica de Aparecida celebrou o Cardeal Cerejeira, Patriarca de Lisboa, que trouxe consigo e depositou junto da pedra fundamental de nosso Santuário Nacional terra retirada do local em que Nossa Senhora apareceu em Fátima. Assim, por desígnio da Providência Divina que tudo dispõe para bem de seus filhos, os destinos do Brasil e de Portugal se uniram uma vez mais sob o olhar materno da Virgem.

Já se vão cem anos dos pedidos de Maria Santíssima e ainda hoje nos deparamos com os problemas para os quais Ela apontou a solução: amar e seguir seu Filho Jesus Cristo. Nada de novo em relação ao que Ela havia dito nas Bodas de Caná: “Fazei tudo o que Ele vos disser” (Jo. 2,5). Se não alcançamos a paz almejada e se nos deparamos com um mundo em constantes conflitos políticos e econômicos à nossa volta é porque não fizemos uso das armas que temos, ou seja, a felicidade está em fazer o que Cristo nos pede e nada mais. Não se trata de uma ordem divina, mas da indicação paternal de como alcançar nosso próprio bem. Essa é a grande mensagem e o grande segredo de Fátima.

L. Raphael Tonon é professor de História, Filosofia e Ensino Religioso nas redes pública e particular, membro da Academia Marial de Aparecida, leigo consagrado da Com. Pantokrator e gestor do Núcleo de Teologia do IFE Campinas (raphaeltonon@ife.org.br).

Artigo publicado no jornal Correio Popular, edição 13/05/2017, Página A-2, Opinião.




O refugiado mais importante da história


Tratando do grave problema da imigração, recentemente o Papa Francisco recordou, sobretudo aos cristãos que Jesus, Maria e José, a Sagrada Família, fugindo da perseguição de Herodes também tiveram que migrar para o Egito e foram acolhidos como estrangeiros numa terra que não lhes pertencia.

Em Roma e em toda a Itália, a ordem do pontífice é de que conventos, monastérios e instituições eclesiásticas abram suas portas para os migrantes e lhes prestem todo o auxílio necessário.

Todas essas medidas são certamente um alento para aqueles que fogem de seus países, mas são paliativas diante da problemática da questão que na verdade envolve situações muito mais delicadas. Na maior parte dos casos são vítimas do Estado Islâmico, porém não são apenas cristãos que fogem desta guerra fundamentalista, os próprios muçulmanos fogem de outros que professam a mesma fé e que adoram ao mesmo Deus que eles. Sem que o percebam reproduzem em menor escala esse mesmo fundamentalismo, como no caso de muitos dos refugiados que se recusam a receber ajuda da Cruz Vermelha pelo fato de os alimentos virem embalados em caixas com uma cruz, símbolo da instituição, mas que é vista por muitos muçulmanos como ofensa à sua fé ou símbolo de negação à mesma.

Fogem da intolerância, mas são intolerantes com aqueles que lhes estendem a mão, desejando que os ajudem enquadrando-se em sua própria fé. Cobram uma tolerância que não são capazes de dar. Ainda assim, é preciso ajudar, é preciso fazer o que for possível, pois antes de serem sírios, africanos, paquistaneses, cristãos ou muçulmanos, são seres humanos.

A Europa que ultimamente têm se aplicado tanto em apagar sua identidade cristã se vê às voltas com a imperiosa necessidade de amar o próximo como a si mesmo, tal como ensinou o Mestre a quem ela nega. Parecem já não saber bem o que fazer. Desaprenderam a fazer aquilo que fazia parte de sua identidade: a caridade. A confusão dos líderes europeus em decidir o quê e como fazer para ajudar, reflete em certo sentido, a indecisão e confusão dos próprios europeus de modo geral.

Resolver problemas teoricamente sempre é fácil, ainda mais para quem pensa e escreve. Difícil mesmo é conviver com a dificuldade nua e crua, porém não é necessário ser muito versado em política internacional para entender que o problema deve ser enfrentado em sua raiz, ou seja, os conflitos ideológico-religiosos de que estas populações são vítimas. Só se pode falar em solução para essa situação através de uma intervenção militar seguida da criação de estruturas institucionais, sociais e econômicas que promovam o progresso dessas regiões. O ideal é que permaneçam na terra que lhes pertence ajudados pelas grandes potências mundiais.

Concretamente, a situação parece ser outra, as grandes potências parecem dar de ombros a essa situação como que a dizer “que se entendam ou que se matem entre si”. Em nome de nossa própria humanidade, não temos o direito de nos furtar a esse problema… E pensar que num passado recente nossa ex-presidente afirmou que é necessário “dialogar” com terroristas islâmicos só nos pode conduzir à conclusão de que os lunáticos que sonham com a “pátria grande” de matriz socialista na América e os fratricidas do Estado Islâmico buscam o poder pelas mesmas vias e com objetivos bastante alinhados, embora a atuação prática seja um pouco diferente na aparência. Lamentável! Mas o problema é ainda mais profundo: o mesmo Cristo que refugiou-se no Egito fugindo de Herodes, segue fugindo durante a história daqueles que o perseguem ao perseguirem e matarem seus semelhantes, segue fugindo como os cristãos de Alepo que só puderam celebrar o Natal em sua catedral toda destruída após cinco anos de exílio, segue sendo perseguido nos membros de seu corpo místico, a Igreja, segue sofrendo em cada homem que sofre.

L. Raphael Tonon é professor de História, Filosofia e Ensino Religioso, gestor do Núcleo de Teologia do IFE Campinas (raphaeltonon@ife.org.br).




Sínodo das Famílias: o que muda?


Imagem: Carmadélio, em http://blog.comshalom.org

Imagem: Carmadélio, em http://blog.comshalom.org

 

Desde o ano passado [2015], quando foi inaugurado pelo Papa Francisco, o Sínodo das Famílias têm despertado visões e análises muito diversas dentro e fora da Igreja Católica.

Muitos agentes da grande mídia mundial viram no Sínodo “novos ares de mudança”; para os católicos progressistas, intérpretes equivocados do Concílio Vaticano II, trata-se de uma oportunidade ímpar para um novo “aggiornamento” da Igreja que poderá se constituir numa oportunidade de alterar a doutrina bimilenar da Igreja a respeito da família; para os defensores da Tradição, o Sínodo cambaleia numa linha tênue entre a misericórdia pastoral e a heresia. Os moderados vêem uma certa coragem em discutir o tema, mas não creêm em mudanças doutrinárias.

Todas essas discordâncias são fruto de propostas aventadas por alguns cardeais que sugeriram, por exemplo, a liberação da Sagrada Comunhão aos divorciados pensando em reintegrá-los não só à participação plena da Eucaristia, mas também ao Sacramento da Confissão. O uso de contraceptivos e a integração mais efetiva de membros homossexuais às comunidades cristãs e os pretensos “novos modelos de família” também foram assuntos discutidos.

A Igreja e mesmo seu líder visível, o Papa Francisco não possuem, como muitos imaginam, a prerrogativa de anular o que Deus mesmo instituiu e inscreveu na Lei Natural, e, aliás, nem parece ser esse o intuito do pontífice que mais de uma vez, quando questionado sobre a moral católica não se pronunciou recordando que o que ele pensa já está expresso no Catecismo da Igreja Católica. O papa da grande mídia parece mais uma caricatura daquilo que muitos desejam que a Igreja seja do que realmente é. Como tudo, isso tem seu lado positivo: muita gente que não dava atenção a nada do que dizia a Igreja, passa agora a olhá-la de modo mais familiar, mas por outro lado não deixa de surpreender muitos católicos com afirmações constantemente descontextualizadas da fala real do pontífice.

A comunhão aos divorciados, com todo respeito que essas pessoas merecem – já que somente elas e o próprio Deus podem saber dos sofrimentos que tiveram em seus matrimônios – é um exemplo claro de algo que doutrinariamente nunca poderá ser admitido, visto que se constituiria na demolição completa da moral católica,ou seja, uma chancela da Igreja para relações extraconjugais, mesmo ainda mantendo o vínculo válido de um casamento anterior. O afrouxamento neste ponto de doutrina seria a destruição de três sacramentos fundamentais: a Eucaristia, a Confissão e o Matrimônio. Este último seria afetado em seu aspecto indissolúvel, a Eucaristia seria afetada porque se daria a comunhão a pessoas que estão objetivamente em estado de pecado mortal e por fim, afetaria o Sacramento da Penitência porque a pessoa recasada não estaria obrigada a se confessar e nem a se arrepender de um pecado mortal, o que abriria um precedente para os demais pecados mortais, de modo que o arrependimento e a correção dos próprios erros para obter o perdão divino já não poderia ser algo requerido do fiel.

È preciso agir e pensar com misericórdia e é necessário sim que a Igreja acolha esses seus filhos que sofrem com o desmantelamento de seus matrimônios, mas a Igreja, fiel aos ensinamentos de Cristo que nos disse que o “homem não deve separar o que Deus uniu” (Mc. 10,9), não pode, não deve e nunca mudará a doutrina sobre o matrimônio. O mesmo se diga dos “novos modelos de família”, um eufemismo que mascara a Ideologia de Gênero. Só existe um único modelo natural de família: pais, mães e filhos. Quanto a questões de fé, de moral e mesmo de cidadania, embasadas nos pressupostos da Lei Natural, esses são princípios inegociáveis. Não podemos servir a dois senhores. Ou servimos à Cristo (modelo de homem por excelência) ou lutamos contra Ele. Não há meio termo.

Luiz Raphael Tonon é professor de História e Filosofia, gestor do Núcleo de Teologia do IFE Campinas e leigo consagrado da comunidade Católica Pantokrator (raphaeltonon@ife.org.br).

Artigo publicado originalmente no jornal Correio Popular, Página A-2, Opinião, edição 20 de Outubro de 2015.